sábado, 30 de junho de 2012

Os melhores contos de Medo, Horror e Morte
Flávio Moreira da Costa (organização)





Os melhores contos de Medo,Horror e Morte,Flávio M.da Costa/organização, Nova Fronteira, 2005, Rio de Janeiro.



Nota- favor ler o texto e ao chegar a Good dreams, ouvir o vídeo de seguida.Cool !




Este livro reúne vinte e seis contos divididos em duas partes. A primeira, tem o nome de MEDO, SUSTO E HORROR e é onde, na minha opinião estão concentrados os melhores contos e os melhores autores.
A segunda vem como MEDO, CLIMA E COTIDIANO, onde também há bons contos e autores como Nathaniel Hawthorne. mas um nadinha deslocados dos da primeira parte.
Destes vinte e seis escolhi oito  porque me pareceram consistentes e bem escritos, além de realmente fazerem juz ao título desta antologia.
Como alguns de seus autores ficaram, por assim dizer, esquecidos ao longo dos séculos, o que é lamentável, deixarei uma brevíssima biografia para que o leitor se tiver interesse, possa ler outros trabalhos desses mesmos autores. E saber um pouco sobre eles.
Leitura de preferência com o corpinho aconchegado na cama,no inverno, em seu quarto, na falta de um castelo medieval ou uma mansão como por exemplo, a Sleep Hollow. Good dreams! 






                            Entraram no clima? Então não saiam!


Primeira parte- Medo, Susto e Horror




O Capitão Assassino- Charles Dickens


Bem ,Charles Dickens creio que dispensa apresentações, para quem teve uma infância sem internet e Playstation  é bem provável que se lembre dele. Para a geração "plugada" com certeza vai se perguntar quem é esse tipo? 
Não quero parecer uma velha mas continuo a achar que uma infância sem livros significa uma vida adulta sem graça nenhuma. Pronto.
Voltando ao Dickens, ele sempre foi um escritor que retratou a infância triste e desafortunada como ninguém, mas também foi um escritor que aterrorizava pobres criancinhas com suas histórias  com personagens bem maus como é o caso do conto "O Capitão Assassino"
 Neste conto, vamos conhecer a história de um senhor chamado Capitão Assassino, ora, já se sabe que neste momento que sabemos o nome do personagem estamos mesmo no centro da imaginação de Dickens, quem mais daria um nome assim? Igualmente sabemos que estas histórias eram passadas oralmente quase sempre pelas babás com o intuito de assustar os pimpolhos.
Capitão Assassino coleccionava casamentos, e noivas, como devem imaginar.
A cada casamento depois de um mês ele chamava sua noiva e lhe apresentava um rolo dourado e um tabuleiro de prata. Trazia também ingredientes básicos para a massa de uma torta salgada.
Quando a esposa abria a massa com o rolo e o estendia no tabuleiro, sempre vinha a pergunta:
_"Querido Capitão Assassino, vai ser uma torta de quê?" (pág.44)
A resposta que elas ouviam, a ouviam uma única vez. Capitão Assassino cortava-lhes a cabeça, picava-as em pedaços, recheava as tortas e as comia.
Assim ia fazendo até que um dia a irmã gêmea de uma das noivas falecidas, resolve dar-lhe uma lição.
Esse conto curtíssimo parece mesmo ter sido feito para as amas contarem às crianças antes de as deitar. Porque na verdade, essa história foi contada ao ao autor quando criança.
Esse ambiente mágico embora assustador não mais  se encontra nas ficções atuais, nem de longe.
Na Era Victoriana, era comum que os contos, histórias infantis fossem mesmo cheias de monstros e pessoas perversas. É aí que começam os problemas psquiátricos meus caros.
É interessante que ao dirigir-se ao personagem como Capitão Assassino, é o mesmo que no conto "Capuchinho Vermelho" a menina chamar o lobo por Sr. Lobo. Era assim que funcionava.
Embora seja um conto simples e quase infantil, vale a pena conhecer, mais não seja para saber que fim terá levado o nosso Capitão Assassino.




                  Estampa comemorativa do bicentenário de Dickens




O Travesseiro de penas- Horacio Quiroga


Alicia era uma moça sonhadora, após três meses de casamento e a viver numa casa antiga e gelada começou a sentir que a moradia lhe estava a influenciar os ânimos além do desencanto com os modos rudes do marido.
No outono começou a perder peso e contraiu uma leve gripe da qual não mais se recuperou.
O médico de família não encontrava a causa de tamanho desfalecimento, pois uma gripe não seria suficiente para deixar a pobre moça naquele estado.
Depois de uma noite de fortes alucinações e horrores passados, Alicia ganhou uma forte anemia. 
O curioso era que no decorrer do dia ela parecia melhor, mas mal despertava,estava lívida e exaurida.
Como era de prever, Alicia acaba por falecer. A criada, ao retirar os lençóis da cama nota que o travesseiro estava com pequenas manchas de sangue, pareciam picadas.
O marido, Jordán, pede à criada que ponha o travesseiro mais perto da luz, ao levantá-lo, apercebe-se de seu peso fora do normal.
Resolve então abri-lo ao meio com uma faca, as penas, esvoaçaram,e deixaram bem visível bem ao meio, o motivo da doença de Alicia e o que causou sua morte.
Sem dúvida, este microscópico conto é uma obra prima por concentrar num texto tão pequeno (o conto tem quatro páginas) um relato completo e assustador. Típico também dos temas da Era Victoriana, embora esse conto tenha ultrapassado um pouco a época, o conto tem os elementos do romantismo gótico como a moça sonhadora, a casa desagradável, a propensão á doenças inexplicáveis, monstros e pesadelos noturnos .
A explicação que o autor dá para a doença e morte de Alicia, é típica de Lovecraft ou Poe.
Vale á pena ler o conto. Mesmo à pena.
Caso seja difícil ter acesso ao livro, o conto é facilmente encontrado na internet em PDF. Leiam!


Horacio Quiroga (1878-1937)

Uruguaio, admirador de Edgar Allan Poe, teve uma vida marcada por tragédias sendo uma delas a morte do pai, morto acidentalmente por si mesmo com um disparo de pistola, depois perdeu o padrasto, e ao inteirar-se de um câncer na próstata, suicidou-se aos 58 anos, bebendo cianureto.Para além de contos de horror, Horacio Quinoga escreveu poemas e novelas com outros temas, incluindo infantis. Seus principais trabalhos são:
Los arrecifes de coral ( poemas, 1901)
El crimen del otro ( cuentos, 1904)
Historia de un amor turbio ( novela,1908)
Cuentos de amor de locura y muerte ( cuentos,1917)
Cuentos de la selva( cuentos infantiles)
Anaconda (cuentos, 1920)


O Estranho incidente na vida do pintor Schalken- Sheridan Le Fanu


Este conto tradicional narra, como o próprio nome indica, um acontecimento muito estranho na vida de Schalken.
Ora, este pintor holandês, discípulo de Gerard Douw, era apaixonado pela sobrinha do mestre, mas nunca chegou a desposá-la.
Deu-se o caso de, numa certa noite, estando Schalken ainda  no estúdio ter sido visitado por um desconhecido que trazia uma recado de um tal Mynher Vanderhausen, o qual gostaria de falar urgentemente com Gerard na noite seguinte.
Quando se dá o encontro, Mynher diz ter a intenção de casar-se com Rose Velderkaust, sobrinha de Gerard. É marcado então, um jantar para que a noiva conhecesse o pretendente.
Assim que este chega, todos os presentes ficam sem ação perante a cor pálida de sua fronte e o ar maligno de sua face.
Muito conta gosto o casamento se realiza dias mais tarde e o novo casal pasaa dias e dias sem dar notícias.
Certa noite, após o jantar, Schalken e Gerard estavam à lareira a fazer a digestão quando ouviram na porta da frente um grande estrondo, como o de uma pessoa a embater contra ela.
Era a pobre Rose, desfigurada, pálida e exausta a pedir alimento, vinho e abrigo. A moça pedia um ministro o mais rápido possível, pois tinha algo revelador para contar.
Mal ela é deixada sozinha no quarto, enquanto o tio ia providenciar o ministro,  a porta do quarto é fechada por uma rajada furiosa de vento.
Os gritos da moça por socorro impeliram o tio e seu discípulo a investir contra a porta na vã tentativa de arrombá-la. Quando os gritos cessaram no aposento a porta cedeu e mostrou o espaço completamente vazio!
Anos e anos depois, Schalken precisou viajar até Roterdão por ocasião do enterro de seu pai.
Foi aí então que teve duas visões espectrais imortalizadas num de seus quadros, e das quais ficou convencido até o dia da sua morte.


Este conto, como a grande maioria dos textos de sua época, vem retomar a atmosfera do conto anterior "O travesseiro de penas" onde prevalece o sobrenatural e situações grotescas por explicar.
As visões que o personagem teve, no jazigo do pai explicam o paradeiro de Rose e a natureza de seu esposo.
O quadro pintado por ele, é o que inicia o conto, quando amigos anos depois falam sobre a pintura.
Em nossa época atual, tais contos podem soar ingênuos ou fantasiosos, mas na época eram mesmo aterrorizantes.
Creio, como leitora experiênte na literatura gótica e de terror, que de uns séculos para cá muito (mas mesmo muito) se perdeu do real conceito de "gótico" e "horror", para dar lugar ao terror com cabeças a rolar, violência gratuita e banhos de sangue e gritos.
Quem não leu uma boa dose dos chamados " romances góticos" não vai entender a idéia que autores como Bram Stocker, Sheridan Le Fanu, Lovecraft,  Robert Louis Stevenson ou até mesmo Emily Bronte, tinham de horror.
Entretanto, como para tudo há uma primeira vez, nada melhor que começar pelos contos, como preparação para a leitura dos romances góticos.
Bons contos nunca vão faltar.


O Hóspede de Drácula- Bram Stocker


"Os mortos viajam rapidamente"(pág.79)


Se o leitor já leu Drácula, do mesmo autor, este conto com certeza vai lhe soar de outra forma de quem não leu.
Provavelmente vai fazer ligações com o livro e tentar encaixá-lo na história.Provavelmente também vai imaginar o personagem inglês do conto, como sendo Jonathan Hacker. E tais ligações estarão corretas, porque este conto era para fazer parte do romance original de Stocker mas foi retirado pelos editores, segundo consta,por tornar o livro demasiado extenso.
A narrativa é bastante interessante, um rapaz inglês de passagem em um hotel em Munique sai pela manhã a passeio com Johann, o cocheiro que é advertido pelo dono do hotel para voltar antes do anoitecer. Primeiro porque uma tempestade se aproximava e segundo porque aquela era a noite de Walpurgis, noite em que, segundo a lenda, bruxas e demónios ficavam à solta pela floresta.
No decorrer do caminho passa por uma pequena estrada e o rapaz diz a Johann que gostaria de seguir por ela. Mas o cocheiro  recusa-se a passar pela estradazita porque acreditava que o vilarejo aonde ela ia dar era amaldiçoado.
O rapaz dispensa então o cocheiro e continua o caminho à pé. Logo na sequência, vai dar a um bosque cerrado e, com a chegada brusca da tempestade e neve, o rapaz vai ter a um cemitério onde procura abrigo em um jazigo. Com a queda de um raio sobre o mármore do jazigo, viu o cadáver de mulher levantar-se e gritar.
Preparando-se para sair dali, ouviu uivos de o que lhe pareceu lobos, e quando deu por si estava caído ao chão com um enorme e pesado lobo sobre seu corpo dificultando sua respiração. Por segundos desmaia e quando volta a si o lobo já lambia-lhe a garganta.
Por milagre um grupo de soldados chega em seu auxílio.
Já de novo ao hotel, o pobre rapaz agradece ao Sr. Delbruck e pergunta como foi que os soldados o encontraram no bosque.
O dono do hotel explica que havia recebido um telegrama do boyar de quem o rapaz era hóspede ordenando que fosse atrás dele caso o suspeitasse em perigo e entrega ao rapaz o telegrama.
Ao lê-lo, o inglês fica atônito, assim como o leitor! 
Gostei imenso do conto. Muito bem escrito sim senhor. Bram Stocker  aterroriza e surpreende de maneira magistral. Mesmo quem ainda não leu "Drácula" vai com certeza gostar do conto.


Algumas adaptações do conto foram feitas e vale á pena dar uma espreitadela.


Dracula's Guest - animação





Dracula's Guest- apresentação



Os Ratos nas Paredes- H.P. Lovecraft


Howard Phillip Lovecraft.
Ora aí está um senhor com o qual eu gostaria de ter tido longas conversas à lareira em noites de inverno após o jantar.
Como diz Flávio Moreira Costa "este autor não tem leitores, tem adeptos".
O primeiro livro de Lovecraft que li foi Nas montanhas da loucura e a partir daí tento ler sua obra inteira. E ainda vou a meio....
Os Ratos nas Paredes não foge ao universo lovecraftiano, universo, aliás, extremamente desencorajador se o leitor for impressionável e propenso a pesadelos ou insónias.
Para entrar pá ante pé em Lovecraft, nada melhor que começar pelos contos, porque se o leitor suportar uma média de vinte páginas por conto, estará pronto para narrativas mais extensas.
O conto escolhido para a postagem é um bom exemplo do quão longe pode a imaginação do autor chegar.
No ao de 1923, o narrador mudou-se para o Priorado de Exham, residência de seus antepassados, que permanecera vazio até então.
De descendência dos De la Poer, o narrador sofrera ostracismo por parte dos campônios que não viam com bons olhos a restauração e ocupação da casa. Eles sabiam muito bem a genealogia amaldiçoada a qual pertencia o novo proprietário.
Tendo como parceiro de pesquisas um amigo do filho já falecido, o capitão Norris, o narrador fica a saber fatos horríveis e macabros sobre seus antepassados. Mas nada o preparara para o que viria a seguir.
Poucos dias depois de instalar-se na nova morada, o narrador nota uma inquietude fora do normal em seu gato, Nigger-Man. O animal ora arranhava as paredes de pedras antigad do escritório, ora fixava o olhar na tapeçaria suspensa na parede.
Seu dono aproximou-se da parede e pareceu-lhe ouvir e passo a citar, "um inequívoco tropel de ratos e camundongos. Súbito, o bichano arremeteu contra a parede de pedras muito antigas e úmidas, remendada aqui e ali pelos restauradores e livres de qualquer vestígio de intrusos roedores." (pág.101)
Com sucessivas noites de incômodo quer por pesadelos, quer pelo ruído dos ratos nas paredes, o narrador vai buscar ajuda de Norris para juntos fazerem uma incursão ao subporão da casa.
O que eles descobrem na cripta subterrânea fazem-nos procurar ajuda de um famoso  arqueólogo. A nova expedição ao subporão vai não só revelar os segredos macabros e inimagináveis dos De la Poer,como também levar o narrador á beira da loucura.
Os Ratos nas Paredes é um conto de leitura dinâmica, repleta de mitos, segredos, horror clássico de gelar o sangue.
Uma pequena amostra do melhor de Lovecraft em apenas vinte páginas.
Algumas adaptações do conto foram feitas em vídeo, e a versão áudio-book, esta, minha velha conhecida, tem a vantagem dos sons de fundo bastante reais que só fazem acrescentar riqueza ao conto.
Escolha sua versão leitor, em papel ou audio-book. Não há desculpa para não conhecer!


                                  The Rats in the walls- Chapter1



Audio Book






A Ressuscitada- Emilia Pardo Bazán


Emilia Pardo Bazan, romancista e contista espanhola ( 1851-1921). Escritora naturalista, produziu uma obra relativamente extensa, principalmente bons livros de contos, embora no Brasil seus contos estejam publicados apenas em antologias.
O conto escolhido, já se entrega pelo título, suas quatro páginas conseguem concentrar literalmente um episódio inusitado e sinistro,sobre  o qual imagino o personagem Jud de "Pet Sematary" (Stephen King) a dizer a Louis Creed: "ás vezes estar morto é melhor".
Somente para aguçar,vou citar um trecho do conto,pois se fizer um breve resumo, estaria comprometendo a surpresa do final, ou mesmo até comprometendo-o todo,afinal  são quatro páginas meus senhores!


"Ardiam os quatro círios soltando gotas de cera. Um morcego, desprendendo-se da abóbada, começava a descrever curvas trôpegas no ar. Uma forma escura, frágil, deslizou rente às lápides e subiu com sombria cautela por uma prega do pano mortuário. No mesmo instante abriu os olhos Dorotea de Guevara, deitada no túmulo.
(...) "Chamar, pedir ajuda àquela hora seria inútil. E de esperar o amanhecer na igreja solitária, não era capaz; na penumbra da nave acreditava que brotavam caras bisbilhoterias de espectros e soavam dolentes queixumes de almas penadas...Tinha outro recurso: sair pela capela do Cristo." (pág. 115)


Agora, caro leitor, cabe a si continuar a leitura....Não se vai arrepender com certeza!


Markheim- Robert Louis Stevenson


Robert Louis Stevenson ficou conhecido pelo seu clássico "Dr. Jekyll e Mr. Hyde e também nos brinda com este conto que fecha a primeira parte do livro.
Temos aqui o seguinte cenário: na noite  de Natal, um rapaz, Markhein, procura um antiquário a fim de comprar uma prenda a uma senhora, que seria sua futura noiva.
A loja, que já estava fechada é apenas iluminada com a fraca luz de velas, o rapaz que busca um presente, há muito está falido, e ao longo dos seus trinta e seis anos de vida, praticou pequenos atos ilícitos.
O senhor que o atende, dono do antiquário, sugere um espelho como prenda, mas o rapaz rejeita a oferta dizendo que um espelho faz as pessoas lembrarem-se daquilo que são. Estaria ele provavelmente a falar de si mesmo.
Começam então uma conversa da qual o antiquário quer esquivar-se mas Markheim insiste em continuar, então o antiquário dá o ultimato: ou ele compra alguma coisa ou se vai embora.
Assim que o senhor inclina-se para apanhar outra prenda, estando portanto de costas para o rapaz, este o ataca violentamente com um punhal.
A partir daí, Markheim entra na paranóia de que alguém na rua poderia ter ouvido alguma coisa, que não estava sozinho na loja, que a empregada do antiquário poderia chegar a qualquer momento. Entra no processo semelhante ao do personagem Raskolnikov de Crime e Castigo.
Começa uma forte chuva quando ele aproxima-se da porta para fugir da loja, e um medo paralisante o impede de sair.
Retorna, e vai avançando pelas escadas a fim de encontrar outra saída. É aí que recebe um visitante inesperado:
"_ Está me chamando?- perguntou o estranho, gentilmente, ao mesmo tempo que entrava e fechava a porta atrás de si." (pág.154)
O visitante, faz uma proposta a Markhein se ele aceitar, terá sua vida financeira segurada, se recusar, poderá estar em sérios problemas.
Para quem já leu o conto "Button, Button" de Richard Matheson, terá uma boa idéia do peso de uma decisão assim.
O conto vai entrar nas questões da consciência do personagem, vai questionar  a sua natureza, a questão de que se um ato criminoso isolado poderá influenciar outros futuramente, na verdade, Stevenson nos faz aqui um relato filosófico da natureza criminosa do ser humano através de Markheim.
Acho interessante poder relacionar um conto publicado em 1884, em uma revista e reeditado no ano seguinte, com o clássico de Dostoiéviski publicado dezenove anos antes(1866) e Button, Button, publicado pela primeira vez coincidentemente em uma revista também, em 1970.
Discursos sobre a natureza do bem e do mal, são atemporais.
Não deixe de ler Markheim e, se possível, Crime e Castigo e Button, Button.


Através do link abaixo pode-se ler o conto Markheim em inglês

http://www.eastoftheweb.com/short-stories/UBooks/Mark.shtml

Segunda parte: Medo, Clima e Cotidiano


Uma Garrafa de Perrier- Edith Wharton


"Uma Garrafa de Perrier " é um conto de mistério. Mas também sobre limites.
E eu que já tantas garrafas bebi, jamais voltarei a beber outra sem lembrar-me deste conto.
O mistério começa por Medford não compreender as razões que levaram seu amigo inglês, Henry Almodham escolher viver no deserto.
Quando chega para visita-lo, depois de uma longa viagem de quatro dias, é avisado pelo criado que seu patrão saíra em uma expedição mas que o esperava na manhã seguinte.
Depois de já instalado e pronto para o jantar, Medford recebe de Gosling, o criado, a pergunta sobre o vinho ou champanhe que desejaria para a ceia; mas este recusa as bebidas dizendo não poder beber álcool por ainda estar a convalescer da malária que apanhara. Pede simplesmente água. Vem então a sugestão novamente de Gosling:
_"Digamos, uma garrafa de Perrier?
Perrier no deserto! Medford sorriu concordando(...) "(pág 315).
Ao dar-se conta que as garrafas de Perrier haviam acabado, Gosling informa que terão que esperar nova remessa.
Volta então a questão da água, que acaba por ser servida fervida e com limão.
No dia seguinte e nos três que se seguiram, a falta de notícias de Henry, e o mal odor da água dos banhos, começa a incomodar  Medford.
Ele tem a idéia de sair a cavalo ao encontro do amigo, mas é dissuadido pelo criado.
Decide então, já com certas desconfianças a respeito da expedição, e do lugar, permanecer no local até que Henry regresse.
Diante dessa nova situação, Gosling que até então parecia controlado, assume outra posição na narrativa.
"Uma Garrafa de Perrier" é um conto sobre limite psicológico ,.
Sobre esticar a corda ao máximo a ver quando ela arrebenta.
Sobre tensão emocional levada ao extremo e sobre o que pode acontecer como consequência.
Ao lerem este conto, que tal uma Perrier bem fresca?
Afinal, se as garrafas não tivessem acabado e os homens não tivessem perdido a remessa no deserto....
Andem lá a ver o que se passou!


        
          Gone, Baby, Gone- Dennis Lehane



Gone, baby, gone, Dennis Lehane, 3ª ed, Gótica, 200, Lisboa
Título original- Gone, baby,gone, 1998

"A cada dia, neste país, vinte e três mil crianças são dadas como desaparecidas" (pág.19)

"Ninguém- nem pais, amigos, autoridades, organizações de cuidados infantis ou centros para pessoas desaparecidas- sabe para onde vão estas crianças. Para campas, possivelmente; para caves ou casas de pedófilos; para vazios, talvez, buracos no tecido do universo onde nunca mais se sabe delas."(pag.19 e20)

"-Sabes como é. Um tipo viu-me na televisão e acha que sou...tipo, uma grande estrela-riu-se. Não é de morrer de rir? Mas pronto, convidou-me pra sair. Ele é giro.
Olhei para a criança no sofá.
-Então e a Amanda? (pág. 436)

Uma criança de quatro anos desaparecida. Uma mãe negligente. Um casal com histórico de pedofilia. Policiais dissimulados. E está o caldo entornado.
"Gone, baby, gone não é simplesmente um policial sobre crianças desaparecidas, pedofilia e famílias disfuncionais.
Faz pensar na velha questão : com quem uma criança estaria melhor? Junto dos pais biológicos levando uma vida de merda(desculpem lá o termo, mas é mesmo assim) ou com pais adotivos com vidas simples e normais?
Quando Amanda McCready, de quatro anos desaparece de sua própria casa, Patrick Kenzie e Angela Gennaro são contratados pelos tios da menina para encontrá-la.
Helene, a mãe da miúda, fazia uma vida noturna bastante agitada,além de envolvimento com traficantes de droga e estar  sempre alcoolizada.
O caso do desaparecimento tem grande repercussão mediática, mas depois cai no esquecimento.
A dupla de detetives não desiste das buscas e conta com a colaboração de uma força policial nem sempre honesta.
Uma segunda criança desaparece e a trama complica-se de verdade.
O policial Jack Douglas, Kenzie e Gennaro entram numa espécie de labirinto surreal envolvendo um  resgate, uma cinematográfica cena na velha pedreira, uma casa medonha, um corpo de criança.
A narrativa é bem escrita e engendrada, um pouco truncada em determinados momentos, não é um livro tão bom como Mystic River ( em breve no blog), mas lê-se bem.
Quando a história termina,  o leitor fica com a sensação desagradável de que nem sempre a missão cumprida é o melhor final. Aliás, o leitor atento já sabia disso o tempo todo, ficava era a torcer para que Patrick voltasse atrás em sua decisão que a ele lhe pareceu correta.
"Gone, baby, gone quando foi lançado em Portugal (2007) coincidiu com o real desaparecimento de Madeleine McCann na praia da Luz, no Algarve.
Também a menina inglesa  que completaria quatro anos desapareceu de dentro do apartamento onde estava com mais dois irmãos, enquanto seus pais jantavam em um restaurante do outro lado da rua.
O caso Maddie permanece aberto até hoje, cinco anos depois.
A menina, que agora teria nove anos, ainda não foi encontrada.
O livro, teve sua versão no cinema pelas mãos de Ben Affleck em 2007.Um bom entretenimento, mas não um filme inesquecível.

                                          
                                          O trailer do filme





domingo, 24 de junho de 2012

           
                      Filme do Mês- Junho         

                  The Changeling- 1980





The Changeling, 1980
Realizador- Peter Medak
Duração- 107 min.
Idioma- inglês
Brasil- O Intermediário do Diabo
Portugal- O desvendar de um mistério
Atores/ Personagens principais- George C. Scott (John Russel), Trish Van Devere( Claire Norman) e Melvyn Douglas ( Senator Joe Carmichael)

Em primeiro lugar quero expressar novamente minha irritação em relação aos títulos mal traduzidos.
Não sei porque cargas d'água o título passou de "The changeling" para "O Intermediário do Diabo".
É por essas e outras que há ainda algum preconceito em relação aos filmes de terror, onde as pessoas infelizmente deparam-se com os adjetivos complementares " do diabo" " do mal" " maldito" "sangrento" e por aí vai...
Enfim...
Bem, de intermediário do diabo o filme não tem nada, no fundo é um filme bem triste até.
Após presenciar a morte da esposa e filha num estúpido acidente de automóvel, John Russel que é compositor e professor universitário de música, muda-se de Nova York para Seatlle a fim de recomeçar a vida.
Vejam bem: um senhor de meia idade, viúvo, solitário, sem sequer um animal de estimação(o piano não conta), ao invés de alugar um daqueles apartamentos "cousin", vai viver em uma mansão (fotos) afastada um nadinha da cidade. Cabe na cabeça de alguém?
Estando quase sempre sozinho em casa, John começa a sentir sutilmente as primeiras vibrações da mansão, seus sons há muito incrustados na madeira antiga e nas paredes, e muitas vezes, num pesado silêncio, tem a impressão de não estar sozinho.
Recordo aqui a cena do piano que é a primeira manifestação concreta, por assim dizer, de que John não está sozinho na mansão.
É quando o personagem está na sala a tocar e uma das teclas não parece bem, estaria emperrada. O jardineiro chama por ele e ele sai para atendê-lo.
Um close no piano e vemos a tecla a bater sozinha emitindo a nota que ecoa pelo salão vazio.
O cotidiano de John segue seu curso, vemos algumas tomadas em seu local de trabalho e a volta para casa ao fim do dia. São cenas solitárias e tristes, a música de fundo acentua essa impressão.
Numa de suas noites solitárias, ouve o ruído de água a escorrer, passa pelos cômodos fechando as torneiras e, ao chegar na casa de banho vê o corpo de um garoto na banheira coberta de água.
Dias depois faz uma incursão ao quarto do sótão e lá descobre além de uma cadeira de rodas de criança, uma caixinha de música e cadernos pertencentes a um rapazinho de nome Joseph.
Nos dias que se seguem o professor é "visitado" por uma bola de brinquedo que desce degrau a degrau as imensas escadarias vinda do sótão.Por sinal, a bola idêntica a de sua filha.
Numa reação furiosa ao pavor, ele atira a bola ao rio.
Mal entra em casa e lá está a bola novamente a descer as escadas.
John vai procurar então a senhorita Claire, que foi quem lhe ajudou a alugar  a casa.
Ambos através de pesquisas em antigos jornais e com a ajuda de um médium acabam descobrindo um terrível segredo.
Acreditando que o Senador Carmichael esteja envolvido, John Russel vai confrontá-lo e tal confronto vai culminar num desfecho fatal.
"The Changeling" é a clássica história de fantasmas com ingredientes sutis e elegantes: a caracterização da mansão, a solidão acentuada do personagem principal, a sutileza dos movimentos de câmera, a banda sonora...
Logo no início,  as cenas das ruas de Nova York dão um toque bem interessante á introdução do filme. Gosto particularmente de introduções de filmes.
A fotografia também vale á pena ser notada neste filme, tem passagens bonitas, mesmo as urbanas. Se repararem na cena em que John vai visitar Claire em seu local de trabalho e ambos vão ao terraço, se derem uma pausa no dvd, vão ver uma bela foto urbana. Quem me dera a mim trabalhar num sítio assim.
O filme tem o teor de thriller psicológico na medida certa para mexer com os nervos do espectador.
A cena em que John volta para casa na noite em que lançou a bola ao rio, é realmente impactante. A casa no mais completo silêncio e de repente, tec, tec, tec, o som da bola ( que supostamente deveria estar no rio) a descer as escadas até ficar imóvel aos pés dele.
Cenas como a da bola e a da cadeira de rodas em chamas, trazem de volta a sensação do medo mais primitivo que há, o do desconhecido. Fica a sensação de medo puro, de estar a sendo acossado por algo etéreo e opressor. É terrível.
Convém lembrar que o filme foi feito sem nenhum efeito especial de última geração como os de hoje em dia, o desempenho dos atores foi excelente, todos foram perfeitos em seus papéis. 
A casa usada para as filmagens foi demolida assim que elas acabaram.Foi pena. 
O nome da casa no filme, Mr. Turtle, é o mesmo nome usado no filme "The Others"


"The changeling" ganhou os prêmios de melhor ator estrangeiro para George C. Scott, melhor atriz estrangeira para Trish Van Devere e melhor roteiro adaptado.
Fica então a sugestão!



A Casa  1


                                                    A Casa 2




Cena do piano

 
Cena da bola


                                            O quarto no sótão



                                    
                                           Primeira parte do filme


               No Café do Sr. Fernando






Well, filme escolhido, é hora de passar no café do senhor Fernando e dar uma espreitadela no prato do dia.
Sugestão: Batatas no forno com espargos e bacon
Para beber, senhor Fernando sugere Super Bock Stout em copo de fino porque os de bojo estão a lavar.
Bom filme e bom apetite!
Ê gato!!!!

                  Batatas no forno com espargos e bacon

500 g de batata nova média
sal
200g de hastes verdes de espargos finas
pimenta acabada de moer
75 g de bacon, fatias finas
75 g queijo Cheddar, ralado
2 colheres de sopa de manteiga
cebolinho para guarnecer

Lavar as batatas e se necessário, escová-las muito bem. Cozê-las muito bem, em água com sal aproximadamente 15 minutos.
Escorrê-las e deixá-las secar.
Lavar os espargos e cortar-lhes as extremidades. Aquecer 1 colher de sopa de manteiga numa frigideira e fritar aí os espargos a lume muito brando aprox. 5 minutos. temperar com sal e pimenta e deixar arrefecer um pouco.
Cortar o bacon em pedacinhos. Partir ao meio as batatas e com uma colher fazer-lhe uma pequena cavidade.
Misturar a massa da batata com bacon e queijo.
Colocar as batatas numa forma untada, repartir aí os espargos e colocar por cima a massa de bacon e queijo.repartir a restante manteiga em pequenas nozes.Levar ao forno pré-aquecido a 200° aproximadamente 10 minutos.
Servir guarnecido com cebolinhos.

(Comer bem, viver melhor, vol.1  Entradas e Petiscos )


Imagem ilustrativa (não é a da receita)


A nossa querida Super Bock Stout



O copo de fino á beira do Douro



sábado, 23 de junho de 2012

                   Meia- Noite- Dean R. Koontz





Meia-Noite, Dean R. Koontz, Record, 1993, Rio de Janeiro.
Título Original- Midnight, 1989


"Viera a Moonlight Cove porque pessoas haviam morrido ali, porque as explicações oficiais de suas mortes eram suspeitas e ele tinha o pressentimento de que a verdade, uma vez descoberta, seria extraordinariamente perturbadora."( pág. 18)


" O que vira no restaurante Perez Family parecia um enigma para o qual qualquer sociólogo, desesperadamente em busca de um tema para sua tese de doutorado, ficaria ansioso para encontrar a resposta." (pág. 50)


"À primeira vista, parece uma cidade como outra qualquer, até mais agradável do que muitas, bem bonita...mas, diabos, depois de algum tempo você tem a sensação de que o povoado todo está  conectado." (pág.118)


Recordem a operação que correu mal na Umbrella Corporation...
Agora pensem numa experiência parecida só que com seres inimagináveis...
Estamos no Projeto Falcão da Lua e, com certeza, ninguém em sã consciência gostaria de fazer parte dele.
O tema da criação de uma Nova Raça, uma Raça Superior, já não é novidade na literatura fantástica ou de terror. Isto sem contar com um certo senhor de bigodinho ridículo que fez um estrago e tanto com essas idéias malucas.
Igualmente a idéia de um único ser a monopolizar toda uma cidade ou até mesmo o mundo, também não é original, vejam por exemplo, 1984 de George Orwell.
Experiências que correm mal também não são novidade, lembram-se com ceretza de A Ilha do Dr.Moureau de H.G.Wells, 
Koontz reuniu em "Meia-Noite" um pouco de cada um desses livros, e criou sua própria "Ilha do Dr. Moureau" e seu próprio "Resident Evil" salvo seja.
para quem gosta da sensação de estar sendo caçado, a sensação de estar constantemente a correr, sem tempo para respirar, este é o livro certo.
Na pacata cidade de Moonlight  Cove mortes misteriosas e brutais ameaçma a segurança dos civis.
Sam Booker, agente do FBI inicia a investigação. Ao chegar à cidade, logo nota que seus habitantes têm um comportamento estranhíssimo, e passa a ouvir sons animalescos perturbadores durante à noite.
A descoberta de que Moonlight está a ser transformada numa Nova Raça, sem sentimentos, sem emoção, mais fortes e com poderes de autoregeneração, leva Sam até ao lado B do projeto Falcão da Lua: "os regressivos", ou seja, aqueles da nova gente que,  por defeito, regridem ao estado primitivo mais puro e se tornam predadores.
Descobre ainda que um computador central está ligado a todos os terminais da cidade, a controlar e vigiar pessoas.
A luta do detetive será, então contra o mentor do projeto, Shaddack, a fim de salvar o que resta de Moonlight Cover. E, de caminho, tentar recuperar seu filho Scott há muito "tresmalhado" dos laços familiares.


Durante alguns trechos do livro em que o autor descreve o comportamento apático das pessoas convertidas à Nova Gente, não pude deixar de  lembrar do filme Invasores,que é a versão mais recente de Vampiros de Almas (1956) e Invasores de Corpos (1978).
Quem viu o filme há de lembrar da falta de expressão no rosto das pessoas que Nicole Kidman desesperadamente tinha que forjar para não ser descoberta.
Não pude deixar de notar também dois trechos interessantes do livro:
"Em determinado momento evangélico, loquaz, Thomas Shaddack falara em desenvolver uma conexão que ligaria um computador a uma tomada cirurgicamente implantada na base da espinha humana.(pág.174)


Ora, ao ler isso veio-me á cabeça o filme Existenz de Cronenberg, no qual um plug era implantado na base da coluna para que os jogadores pudessem se conectar ao jogo. A energia para jogar vinha da própria pessoa. Um filme por sinal que vale á pena.


2- "Ele agora vivia num mundo lovecaftiano de forças cósmicas e primitivas, de entidades monstruosas caçando a presa à noite, onde seres humanos estavam reduzidos a pouco mais do que gado, onde o universo judeu-cristão de um Deus de amor fora substituído pela criação dos antigos deuses que eram impulsionados por desejos nefastos, que tinham o gosto pela crueldade e uma sede insaciável de poder."(pág.387)






Onde foi que já vi isso? No livro Admirável Mundo Novo de Wells, cá está ele novamente...
Com a referência a Lovecraft, Koontz dá a idéia certa do espírito de Moolight Cover, durante o caos gerado pelo Projeto Falcão da Lua. Melhor exemplo impossível.
Por fim a parte referente à substituição do espírito judaico-cristão pela sede do poder e crueldade, achei-a mais atual e real  impossível.
Já leram os jornais hoje?????


Bem, sem rodeios,  o livro nada tem de original como narrativa.
Mas o autor se vale bastante da metalinguagem ao longo do livro.
Nada de novo no front.
Mas vale como entretenimento.
1x1. Desempate o leitor!


Ah, gostaria de reproduzir um diálogo entre Sam e o dono do bar que não tem importância nenhuma na trama em si, mas traduz exactamente o que eu penso:


"- Tem Guinness?- perguntou Sam.
 - É a bebida essencial de um verdadeiro bar, eu diria. Se não tivéssemos Guinness...bem, seria melhor nos transformarmos numa casa de chá." (pág.24)


Ora nem mais!!!!




Invasores, 2007





Existenz, 1999






segunda-feira, 18 de junho de 2012

Hi Folks!
Gostaria que constasse nos autos que a partir desse mês, Hello Clarice terá uma nova rubrica chamada Filme do Mês.
Todo final de mês, vou fechar as leituras com um filme dentro do terror e suspense, que tenha valor significativo para mim e não necessariamente com  relação direta  com os livros apresentados no blog.
Cada filme será meio que esmiuçado e autopsiado....rs
Well, não postarei aqui filmes muito dentro do circuito comercial, primeiro porque não é nada meu fazer isso, segundo porque acredito que o melhor dos filmes de suspense e terror, estão nas décadas de60, 70, 80 e alguns dos anos 90 vão se safando. Com raras excepções, um ou outro mais recente.
A rubrica Filme do Mês será acompanhada sempre de No Café do Sr. Fernando que será nada mais que receitas de drinks, petiscos, bebidas quentes para acompanhar o filme.
Que conste nos Autos!

domingo, 17 de junho de 2012


DEPOIS DA MEIA-NOITE - STEPHEN KING





Depois da Meia-Noite, Stephen King, Francisco Alves, l992, Rio de Janeiro.
Título original- Four Past Midnight


Gosto bastante deste livro, porque estes contos, particularmente têm todos como tema aquela tênue linha entre a realidade e um universo paralelo; ou ainda, a linha tênue entre a sanidade e a insanidade, que, ao que parece, é fácil de ser transposta.
Os contos deste livro tratam de pessoas normais, levando a vida dentro de suas rotinas, quando são surpreendidas por um acontecimento que despoleta o inimaginável, que abre portas e em alguns casos, janelas, para a entrada do absurdo.
Em todos, há um momento crucial, porém naturalíssimo, em que o "clic" se faz, um divisor de águas, que, uma vez transposto, bastando somente um único dedo do pé além da linha, não há volta a dar.
São quatro, por isso o título, "Four past midnight", e a meia noite não é a que os relógios marcam, o tempo físico, é o tal tempo suspenso, onde não sabemos, de facto, de que lado estamos.
Cuidado, leitor, onde pisa.


Meia-noite e um- Os Langoliers (The Langoliers)
 " Foi quando Brian sentiu algo- algo assim como um choque- começando a abrir caminho até o fundo de sua mente. Foi quando sentiu que toda sua estrutura de ser pensante organizado começou a deslizar lentamente para algum abismo insondável."(pág. 50)


O piloto do avião da American Pride,Brian Engle, pousa no aeroporto de Los Angeles e recebe a notícia de que sua esposa morreu em um incêndio. Apanha outro avião  a fim de comparecer ao enterro.Mal senta-se adormece quase de imediato.
Ao acordar, apercebe-se que quase todos os passageiros desapareceram e que está prestes a aterrissar em um aeroporto vazio no Maine.
Brian, que assume o comando do avião juntamente com o que resta dos passageiros, inicia uma busca por respostas para que consigam ter para onde voltar. Porque, assim de repente, a América toda está vazia.
Afinal, para onde terão ido as pessoas? Quem são os Langoliers?
"Os Langoliers" transformou-se numa minissérie para TV em 1995.
Se estiver a pensar voar nos próximos tempos, deixe para ler o conto quando voltar. 


                                     Uma Fenda no tempo, 1995






Meia-noite e dois- Janela Secreta, Secreto Jardim(Secret Window, Secret Garden)


"Algumas vezes, no entanto, as janelas se quebram. Creio que, mais do que qualquer coisa, esse é o interesse dessa história: o que acontece ao observador de olhos arregalados quando a janela entre a realidade e a irrealidade se quebra, quando as vibrações começam a voar." ( Stephen King, nota introdutória, pág 228)


De todos os contos deste livro, este é o meu preferido.
Mort Rainey,  escritor, após o divórcio vai viver para a casa de campo do casal no Lago Tashmore a fim de escrever seu livro.
Certa manhã, é surpreendido por um estranho que lhe bate à porta acusando-o de plagiar sua história.
Mort despacha o homem e diz que não o conhece e muito menos a história da qual é acusado de plágio.
John Shooter antes de sair, deixa a cópia de sua história na varanda. A cópia é encontrada pela senhora da limpeza e entregue a Mort.
Ao ler a história de Shooter, Mort percebe uma certa semelhança com a sua. Lembra-se então, que publicou a sua em uma revista  antes de a publicar em livro.
Ao ser confrontado com essa nova informação, Shooter dá a Rainey três dias para provar que "Tempo de Plantar" foi escrita antes de "Janela Secreta, Secreto Jardim".
Mort telefona a ex- esposa que iria a casa do casal apanhar a revista, fica a saber que a residência havia ardido.
Desesperado, procura seu editor que fica de enviar um exemplar da revista pelo correio. Quando a recebe, nota que as páginas onde estavam seu conto, foram arrancadas.
Numa sucessão de infortúnios por conta da tal história, com as ameaças e pressão de Shooter, o escritor passa a ter flashes confusos de memória sobre a história, sobre a traição da esposa que culminou no divórcio, sobre o jardim secreto por trás da janela da casa de campo.
A narrativa começa a baralhar o leitor á medida que o próprio personagem vai perdendo a noção da realidade.
Um desfecho surpreendente é o que espera o leitor, se olhar atentamente pela  pequena janela que vai dar ao jardim....
A adaptação do conto rendeu um bom filme onde  Johnny Deep no papel de Mort, e John Turturro como Shooter, recriaram na perfeição o espírito do conto original.



Janela Secreta, 2004





Meia- noite e três- O Policial da Biblioteca (The Library Policeman)


" Sam tivera uma vida comum, cheia de prazeres comuns e comuns arrependimentos; uma vida sem análises exageradas. Nunca vira seu nome em grande evidência, porém jamais tivera qualquer motivo para questionar a própria sanidade. Agora via-se deitado em sua cama desalinhada e perguntando-se se era assim que uma pessoa despencava do mundo real, racional. Se era assim que começava quando alguém perde o juízo." (pág. 441)


Sam Peebles, um cidadão comum, é chamado para substituir um colega seu que sofrera um acidente e que iria discursar na Noite do Orador dos rotarianos.
Ora, querendo dar o seu melhor, vai até a biblioteca de Junction City em busca de livros de oratória.
Na sala antiga da biblioteca, a senhora Ardelia Lortz o ajuda a encontrar os livros e adverte que terá de os devolver até o dia marcado caso contrário o Policial da Biblioteca iria fazer uma visita desagradável.
Sam passa por alguns percalços que o impedem de devolver os livros a tempo.
Quando volta a biblioteca esta já não é a mesma, está mais modernizada e a antiga funcionária que o atendeu já lá não está.
Sam fica confundido e só depois percebe que na verdade coexistem duas bibliotecas e terá que enfrentar o Policial da Biblioteca se quiser voltar a ter dias de paz.
Fico a imaginar esse conto na série "Twinlight Zone" encaixa-se na perfeição.
A preto e branco, estilo anos 60, a visita do Policial da Biblioteca, enorme, rosto oval e olhos grandes....
E logo eu que sou frequentadora assídua de bibliotecas ai de mim se um dia entrasse em uma delas e trá lá lá, trá lá lá estivesse num episódio da "Twinlight Zone..." Great!


Meia- noite e quatro- O cão da Polaroid (The Sun Dog)


" Entretanto, nessa noite o sono não chegou para Kevin com facilidade.Acordado em seu quarto, ele ouvia um forte vento de fim de verão sacudindo  as folhagens no exterior em sussurrante conversa, enquanto refletia no que levaria a câmara a bater sempre a mesma foto, sempre, sempre e sempre, e o que isto significaria. Somente começou a escorregar para o sono quando sentiu que tomara uma decisão: continuaria por mais algum tempo com a Polaroid Sun." (pág.538)

Kevin ganha pelo seu aniversário de quinze anos uma Polaroid.
Ao testar a câmera, vê que esta tira a mesma foto repetidas vezes.
O que a foto revela é um cão negro em frente a uma cerca branca de madeira.
Intrigado, o rapaz leva a máquina a um senhor, Pop Merrill,  para que ele a conserte.
Entretanto o senhor fica seduzido pela máquina e começa a disparar fotos sem saber que está aproximando cada vez mais o cão do mundo real. Cada foto disparada equivale a um movimento mais próximo do animal.
Kevin terá que ser rápido o bastante para impedir o salto do cão para fora da foto direto para o mundo real.
Enquanto realizadores e produtores ficam por aí a fazer "remakes" de filmes de terror dos anos 80 e 90, poderiam pensar em algo mais interessante como "O Cão da Polaroid"